quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Iemanjá

Com o casamento de Obatalá, o Céu, com Odudua, a Terra, que se iniciam as peripécias dos deuses africanos. Dessa união nasceram Aganju, a Terra, e Iemanjá (yeye ma ajá = mãe cujos filhos são peixes), a Água. Como em outras antigas mitologias, a terra e a água se unem. Iemanjá desposa o seu irmão Aganju e tem um filho, Orungã.

Orungã, o Édipo africano, representante de um motivo universal, apaixona-se por sua mãe, que procura fugir de seus ímpetos arrebatados. Mas Orungã não pode renunciar àquela paixão insopitável. Aproveita-se, certo dia, da ausência de Aganju, o pai, e decide-se a violentar Iemanjá. Essa foge e põe-se a correr, perseguida por Orungã. Ia esse quase alcançá-la quando Iemanjá cai no chão, de costas e morre. Imediatamente seu corpo começa a dilatar-se. Dos enormes seios brotaram duas correntes de água que se reúnem mais adiante até formar um grande lago. E do ventre desmesurado, que se rompe, nascem os seguintes deuses: Dadá, deus dos vegetais; Xango, deus do trovão; Ogum, deus do ferro e da guerra; Olokum, deus do mar; Oloxá, deusa dos lagos; Oiá, deusa do rio Niger; Oxum, deusa do rio Oxum; Obá, deusa do rio Obá; Orixá Okô, deusa da agricultura; Oxóssi, deus dos caçadores; Oké, deus dos montes; Ajê Xaluga, deus da riqueza; Xapanã (Shankpannã), deus da varíola; Orum, o Sol; Oxu, a Lua.

Os orixás que sobreviveram no Brasil foram: Obatalá (Oxalá), Iemanjá (por extensão, outras deusas-mães) e Xango (por extensão, os outros orixás fálicos).

Com Iemanjá, vieram mais dois orixás yorubanos, Oxum e Anamburucu (Nanamburucu). Em nosso país houve uma forte confluência mítica: com as Deusas-Mães, sereias do paganismo supérstite europeu, as Nossas Senhoras católicas, as iaras ameríndias.

A Lenda tem um simbolismo muito significativo, contando-nos que da reunião de Obatalá e Odudua (fundaram o Aiê, o "mundo em forma"), surgiu uma poderosa energia, ligada desde o princípio ao elemento líquido. Esse Poder ficou conhecido pelo nome de Iemanjá.

Durante os milhões de anos que se seguiram, antigas e novas divindades foram unindo-se à famosa Orixá das águas, como foi o caso de Omolu, que era filho de Nanã, mas foi criado por Iemanjá.

Antes disso, Iemanjá dedicava-se à criação de peixes e ornamentos aquáticos, vivendo em um rio que levava seu nome e banhava as terras da nação de Egbá.

Quando convocada pelos soberanos, Iemanjá foi até o rio Ogun e de lá partiu para o centro de Aiê para receber seu emblema de autoridade: o abebé (leque prateado em forma de peixe com o cabo a partir da cauda), uma insígnia real que lhe conferiu amplo poder de atuar sobre todos os rios, mares, e oceanos e também dos leitos onde as massas de águas se assentam e se acomodam.

Obatalá e Odudua, seus pais, estavam presentes no cerimonial e orgulhosos pela força e vigor da filha, ofereceram para a nova Majestade das Águas, uma jóia de significativo valor: a Lua, um corpo celeste de existência solitária que buscava companhia. Agradecida aos pais, Iemanjá nunca mais retirou de seu dedo mínimo o mágico e resplandecente adorno de quatro faces. A Lua, por sua vez, adorou a companhia real, mas continuou seu caminho, ora crescente, ora minguante..., mas sempre cheia de amor para ofertar.

A bondosa mãe Iemanjá, adorava dar presentes e ofereceu para Oiá o rio Níger com sua embocadura de nove vertentes; para Oxum, dona das minas de ouro, deu o rio Oxum; para Ogum o direito de fazer encantamentos em todas as praias, rios e lagos, apelidando-o de Ogum-Beira-mar, Ogum-Sete-ondas entre outros.

Muitos foram os lagos e rios presenteados pela mãe Iemanjá a seus filhos, mas quanto mais ofertava, mais recebia de volta. Aqui se subtrai o ensinamento de que "é dando que se recebe".

Deusa Lunar da Mudança

A Deusa Iemanjá rege a mudança rítmica de toda a vida por estar ligada diretamente ao elemento água. É Iemanjá que preside todos os rituais do nascimento e à volta as origens, que é a morte. Está ainda ligada ao movimento que caracteriza as mudanças, à expansão e o desenvolvimento.

É ela, como a Deusa Ártemis o arquétipo responsável pela identificação que as mulheres experimentam de si mesmas e que as definem individualmente.

Iemanjá quando dança, corta o ar com uma espada na mão. Esse corte é um ato psíquico que conduz a individualização, pois Iemanjá separa o que deve ser separado, deixando somente o que é necessário para que se apresente a individualidade.

Sua espada, portanto, é um símbolo de poder cortante que permite a discriminação ordenativa, mas que também pode levar ao seu abraço de sereia, à regressão e à morte.

Em sua dança, Iemanjá coloca a mão na cabeça, um ato indicativo de sua individualidade e por isso, é chamada de"Yá Ori", ou "Mãe de Cabeça". Depois ela toca a nuca com a mão esquerda e a testa com a mão direita. A nuca é símbolo do passado dos homens, ao inconsciente de onde todos nós viemos. Já a testa, está ligada ao futuro, ao consciente e a individualidade.

A dança de Iemanjá pode ser percebida como uma representação mítica da origem da humanidade, do seu passado, do seu futuro e sua individualização consciente. É essa união antagônica que nos dá o direito de vivermos o "aqui" e o "agora", pois sem "passado", não temos o "presente" e sem a continuidade do presente, não teremos "futuro". Sugere ainda, que a totalidade está na união dos opostos do consciente com o inconsciente e dos aspectos masculinos com os femininos.

Como Deusa Lunar, Iemanjá tem como principal característica a "mudança". Ela nos ensina, que para toda a mulher, o caráter cíclico da vida é a coisa mais natural, embora seja incompreendido pelo sexo masculino.

A natureza da mulher é impessoal e inerente a ela como um ser feminino e altera-se com os ciclos da lua: fase crescente, cheia, meia-fase até a lua obscura. Essas mudanças não só se refletem nas marés, mas também no ciclo mensal das mulheres, produzindo um ritmo complexo e difícil de entender. A vida física e psíquica de toda a mulher é afetada pela revolução da lua e a compreensão desse fenômeno nos propicia o conhecimento de nossa real natureza instintiva. Em poder desse conhecimento, podemos domesticar com o esforço consciente as inclinações cíclicas que operam-se a nível inconsciente e nos tornarmos não tão dependentes desses aspectos escondidos de nossa natureza semelhante aos da lua.

Texto pesquisado e desenvolvido por Rosane Volpatto

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